Fui ver Blue Jasmine. Numa nota rápida, um filme duro sobre a grande ilusão da ascensão social e, claro, sobre a culpa daqueles que transgridem uma determinada ordem moral. Atualizando a anti-heroína Blanche, de A Streetcar named Desire ( Tenessee Williams), W. Allen mostra que é exímio no storytelling, como sempre. Lembro-me, é claro, de Vigaristas de Bairro, filme em que o tema da ascensão social já aparecia, mas, citando o crítico da Vanity Fair, é bom ver Woddy Allen sair do seu bairro dourado de «eleitos» em Nova Iorque e estilhaçar a loiça toda com esta socialite que dá pelo nome de Jasmine (née Jeanette), interpretada de forma brilhante por Cate Blanchett. Com Jasmine, Allen regressa à tragédia de forma magistral. O filme é o final de uma história que, depois, nos é dada em flashback. Numa sociedade em que a ascensão não se constrói sobre a inocência, Jasmine saiu do nada e atingiu o topo. Perguntamo-nos até que ponto chegou o pacto que Jasmine fez com o diabo da fama e da riqueza. Completamente aristotélico, Allen dá-nos chaves para irmos percebendo a culpa trágica de Jasmine: aparentemente Jasmine não quer saber da ética e da moral para nada, mas também parece ignorar deliberadamente os «negócios» do marido para viver no seu planeta dourado em Nova Iorque. Perguntamo-nos: mas ela sabe ou não sabe das corrupções, das negociatas, das manobras mafiosas, dos jogos sujos?... Sabe, é o que Allen nos vai dizendo. Primeiro, porque arrastou a irmã e o cunhado (que queriam investir honestamente o dinheiro numa empresa) para a estratosfera dos negócios de risco do marido, e Jasmine é a instigadora do processo. Depois porque, traída pelas várias amantes de Hal (que ela teima em ignorar), Jasmine só reclama vingança quando a coisa da vergonha se torna pública. O divórcio não a satisfaz, a vigança materializa-se num telefonema para o FBI que leva rapidamente Hal à prisão e à morte. Jasmine sabe muito bem para quem devia telefonar para se vingar de Hal. Jasmine sabe das fraudes, sabe dos crimes, logo, foi cúmplice de tudo e, portanto, foi parcialmente culpada. Arrastada para a desgraça da falência até à loucura, nada a pode redimir. O encontro com o diplomata adia-lhe uma vez mais as ilusões de poder, mas a aparição operática do ex-cunhado fornece a estocada final para um desenlace brutal.
É interessante ver Allen aflorar a demência da cultura e sociedade atuais, desde a composição do retrato do gangster da banca e dos «negócios» tóxicos ( Hal Francis interpretado por um Alec Baldwin perfeito para o papel) ao mundo horribilis da ambição e futilidade de um pretendente (Peter Sarsgaard no papel de Dwight Westlake) ao universo dos trepadores das modernas magistraturas políticas ( lideres partidários, diplomatas, políticos em ascensão e outros animais afins...). No fim, não resta nada, o real que fica é a loucura e a demência de Jasmine... um murro. Soberbo.
Fico à espera do próximo filme de Allen...
Fica o link para o artigo de crítica na Vanity Fair...http://www.vanityfair.com/online/daily/2013/07/movie-review-blue-jasmine-woody-allen
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